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terça-feira, 11 de novembro de 2025

Caso Membros do Sindicato Único de Trabalhadores de ECASA (SUTECASA) vs. PERU: qual a sua relevância jurídica?

Caso Membros do Sindicato Único de Trabalhadores de ECASA (SUTECASA) vs. PERU: qual a sua relevância jurídica?

Em junho de 1990, a Empresa Comercializadora de Alimentos S/A (ECASA) celebrou acordo coletivo com o Sindicato Único dos Trabalhadores da ECASA (SUTECASA), com vigência entre maio/1990 e abril/1991, prevendo diversos benefícios, como auxílio escolar, quinquênios, reajustes salariais etc.

Em agosto do mesmo ano, o governo peruano emitiu dois decretos presidenciais pelos quais limitou empresas estatais, como a ECASA, a conceder aumentos salariais e benefícios por acordos coletivos de trabalho.

Com isso, em setembro de 1990, o sindicato laboral (SUTECASA) ajuizou ação trabalhista para declaração de inaplicabilidade desses decretos, diante do pactuado no acordo coletivo de trabalho. A ação foi julgada procedente, tornando tais decretos sem efeito para os trabalhadores representados pelo sindicato, sendo-lhes reconhecido o direito à reparação financeira.

Porém, a fase de execução se arrastou por décadas, com várias perícias realizadas para apurar o valor devido a cada trabalhador, seguidas de pedidos de revisões feitos pelo Estado do Peru. Em 2021, ou seja, mais de trinta anos após o ajuizamento da ação, o processo foi arquivado sem que o direito reconhecido judicialmente fosse satisfeito, o que permitiu a judicialização perante a Corte IDH após juízo positivo de admissibilidade pela CIDH.

E o que a Corte IDH decidiu?

Primeiro, a Corte reconheceu que a fase de execução da sentença enfrentou dificuldades, mas concluiu que o Estado do Peru tinha o dever de garantir seu andamento adequado. A demora excessiva, segundo o Tribunal Internacional, violou a garantia de duração razoável do processo judicial (art. 8.1 da CADH) e o direito à proteção judicial (art. 25.1 da CADH).

Além disso, a Corte reconheceu que o Estado violou o art. 25.2.c da CADH, ao não garantir o cumprimento da decisão judicial favorável aos trabalhadores representados pelo sindicato laboral – neste ponto, ainda reconheceu que esse é um problema estrutural no Peru (o descumprimento de decisões judiciais e a demora na execução de sentenças), vide os casos “Femapor vs. Peru” e “Trabalhadores do Congresso vs. Peru”, em afronta ao art. 2 da CADH (dever de adotar medidas internas para efetivar os direitos humanos).

No ponto nevrálgico da sentença, a Corte IDH entendeu que a proteção à negociação coletiva deriva do art. 26 da CADH e alcança não somente o direito de negociar, como também de ver cumprido o pactuado, reconhecendo a força normativa e vinculante dos instrumentos celebrados.

Assim, entre outras condenações, a Corte condenou o Estado do Peru ao pagamento de indenizações por danos materiais e morais aos trabalhadores prejudicados pelos decretos presidenciais, além da adoção de medidas para que a sentença interna seja definitiva e efetivamente cumprida.

Qual a relevância jurídica deste julgamento?

Podemos afirmar que, para a Corte IDH, a negociação coletiva é um direito autônomo (derivado diretamente do art. 26 da CADH) e exigível (“justiciabilidade dos direitos sociais”), vinculado à liberdade sindical, sendo dever dos Estados-membros garantir o cumprimento das normas coletivas.

Além disso, o precedente é importante para o direito sindical, ao reconhecer que a demora ou inexecução de sentença trabalhista coletiva pode configurar violação de direitos humanos por Estado-membro, de modo que decisões internas ineficazes podem ser questionadas no plano internacional.

Essa sentença tornou-se, portanto, referência na proteção internacional dos direitos trabalhistas, reafirmando-os como direitos humanos.

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Nota de autoria

Texto de autoria de Gustavo Ribas Rodrigues Alves (Editor da revista digital Info TST; Assistente de Juiz do Trabalho no TRT da 18ª Região; Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Paulista de Direito – EPD). 

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