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terça-feira, 3 de março de 2015

Química da intrusão

Química da intrusão

 Poder diretivo (intraempresarial) é prerrogativa decorrente do contrato de trabalho para determinar o “modus operandi” da prestação dos serviços dentro da dinâmica e estrutura empresariais. Uma de suas facetas compreende justamente o ofício fiscalizatório na prestação dos serviços. Tem-se, portanto, um conjunto de prerrogativas que são deferidas ao empregador com o intuito de fiscalizar e controlar a atividade desempenhada pelo empregado ao longo do contrato de trabalho. Trata-se de faculdade que o empregador detém para acompanhar e monitorar a prestação de serviços que é realizada pelo empregado no espaço empresarial.

 Sabe-se, de outra parte, que o abuso do direito consiste exatamente na extrapolação dos limites sociais, jurídicos e éticos consignados ao exercício de um direito legítimo (artigo 187 do Código Civil). Neste agir, traz-se a expressão utilizada pela Organização Internacional do Trabalho “química da intrusão”, que nada mais é do que o abuso do direito de fiscalização. Em outras palavras, trata-se do fenômeno reiterado da intromissão na esfera privada do empregado, vilipendiando seus direitos fundamentais e de personalidade. Como exemplo, pode-se citar a instalação de câmeras em banheiros disponíveis aos empregados.

 Nesse sentido:
“PODER DE DIREÇÃO. USO DE APARELHOS AUDIOVISUAIS EM SANITÁRIOS. INVASÃO DA INTIMIDADE DO EMPREGADO. A instalação de câmera de vídeo ou de filmagem constitui uma medida ajustada ao princípio da proporcionalidade (GOÑI SEIN, José Luis. La videovigilancia empresarial y la protección de datos personales. Thompson/Civitas, 2007, p. 30, 31, 37, 50 e 54) considerando que a instalação em local onde o empregado executa suas atividades é medida justificada, equilibrada e imprescindível. Esse princípio não é o único limite que existe nas instalações de câmeras de vídeo. O poder de fiscalização do empregador é limitado ao uso dos banheiros como proteção à intimidade do empregado. Entretanto, poderá ser admissível, excepcionalmente, quando o empregado viola suas obrigações, passando no banheiro um tempo claramente desnecessário para fumar, ler ou realizar outras atividades. Alguns autores sustentam que o âmbito de espaços reservados ao uso privativo dos empregados (serviços higiênicos, vestuários e zonas de descanso) é preservado, permitindo-se a colocação de câmara de vídeo, excepcionalmente, até a porta dos lavabos, mas localizados em lugares públicos insuscetíveis de visualização dos setores privados reservados aos empregados. O empregador que deixa de observar tais critérios e instala câmera de vídeo em vestiário utilizado pelos empregados provoca dano moral resultante da afronta à intimidade desses trabalhadores, direito assegurado por preceito constitucional (art. 5º, X) e conceituado como a faculdade concedida às pessoas de se verem protegidas “contra o sentido dos outros, principalmente dos olhos e dos ouvidos”. A vigilância eletrônica poderá ter um futuro promissor, desde que usada de forma humana, combatendo-se os abusos na sua utilização. Instalação de aparelho audiovisual no banheiro caracteriza o que a OIT denomina “química da intrusão”, comportamento repudiado pelo ordenamento jurídico nacional e internacional.” (TRT3; RO-01024.2008.024.03.00.5; Relatora: Alice Monteiro de Barros; Publicado em 23/06/2009)

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