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terça-feira, 3 de abril de 2018

Redutor em caso de pensionamento em parcela única


Redutor em caso de pensionamento em parcela única

A indenização por dano material decorrente de incapacidade para o labor não foi regulamentada pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), tendo esta regido apenas a questão dos danos de natureza extrapatrimonial, o que induz a assertiva de que a pensão prevista no art. 950 do Código Civil é aplicável, de forma subsidiária, ao direito do trabalho, de acordo com o art. 8º, § 1º, da CLT.

Para melhor elucidação, registro que o art. 950 do Código Civil dispõe o seguinte:

“Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.”

Do texto do art. 950 do Código Civil, extrai-se que, para que seja devido o pagamento de pensão, é preciso que haja uma redução permanente da capacidade laboral ou que não seja mais possível ao trabalhador o exercício do seu ofício. Sendo assim, ante o reconhecimento de incapacidade em relação às atividades desempenhadas, apurado em laudo pericial e com base em juízo de cognição exauriente, a vítima fará jus ao pagamento de pensão para a compensação da redução de sua força de trabalho.

Apesar da dicção bastante clara do parágrafo único do art. 950 do Código Civil, atualmente a jurisprudência sedimentada do C. TST, estabelece a diretriz de que a possibilidade de pensionamento em parcela única não diz respeito a direito potestativo da parte, cabendo ao poder discricionário do julgador deferi-lo, levando em consideração fatores como a situação econômica dos litigantes e o impacto financeiro que a condenação acarretará no funcionamento da empresa. Trata-se de interpretação “contra legem”.

De acordo com este entendimento, também não há que se falar em pagamento do pensionamento de uma só vez, porque o pagamento parcelado é menos gravoso para a reclamada, além de mais benéfico para o trabalhador, na medida em que o protege de eventual má administração da quantia recebida em cota única, comprometendo a sua própria sobrevivência. Nesse sentido:

"RECURSO DE EMBARGOS - INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.496/2007 - INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS - FORMA DE PAGAMENTO - PENSÃO MENSAL - INDENIZAÇÃO ÚNICA - FACULDADE DO MAGISTRADO. Na esteira da jurisprudência desta Subseção, o parágrafo único do art. 950 do Código Civil não retira do juiz a prerrogativa de, sopesados a situação econômica das partes e os efeitos da eventual condenação a parcela única sobre a atividade do empregador, substituir a escolha da reclamante, determinando, assim, o pagamento de pensão mensal vitalícia no lugar de parcela única, a título de lucros cessantes pela perda ou redução da capacidade laboral. Precedentes da SBDI-1. Recurso de embargos conhecido e desprovido." (E-RR- 60200-17.2005.5.20.0001, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, SDI-1, DEJT 03/10/2014)

"DANOS MATERIAIS - PENSÃO PREVISTA NO ARTIGO 950 DO CÓDIGO CIVIL - PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA - INEXISTÊNCIA DE DIREITO POTESTATIVO DO OFENDIDO. Esta Corte, interpretando o disposto no artigo 950 do Código Civil, vem entendendo que, embora conste no seu parágrafo único competir ao prejudicado -exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez-, não se trata de direito potestativo do ofendido, já que cabe ao magistrado, no exercício de sua livre convicção e levando em consideração as particularidades do caso concreto - como a situação econômica de ambas as partes e o impacto financeiro da condenação sobre a reclamada, bem como a capacidade do empregado de administrar a quantia devida, dentre outros fatores -, definir a melhor forma de pagamento da indenização, de forma a se privilegiar tanto a saúde financeira do lesado quanto a importância social da empresa. Recurso de embargos conhecido e provido." (E-ED-RR - 20140-31.2006.5.03.0036, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, SDI-1, DEJT 28/03/2014)

Não exclui o direito ao pensionamento a eventual concessão de benefício previdenciário. A responsabilidade do empregador por dano material causado ao empregado por culpa ou dolo subsiste independentemente do benefício previdenciário. A acumulação da indenização do direito comum (art. 186 do Código Civil) é expressamente assegurada pelo art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, assim como pelo art. 121 da Lei n. 8.213/91. Nesse sentido é o entendimento preconizado na Súmula n. 229 do STF.

O C. TST, quando da aplicação da hipótese prevista no parágrafo único, do art. 950, do Código Civil, isto é, em caso de deferimento de pensionamento em parcela única, institui um determinado “redutor” (deságio) no montante indenizatório, em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. A tese é de que o redutor amenizará um desequilíbrio econômico-financeiro entre as partes advindo da indenização arbitrada.

A título de exemplificação, transcrevo os seguintes julgados:

"EMBARGOS REGIDOS PELA LEI Nº 11.496/2007. DANO MATERIAL. PENSÃO MENSAL. PAGAMENTO EM COTA ÚNICA. APLICAÇÃO DE PERCENTUAL REDUTOR. DESÁGIO. POSSIBILIDADE. Discute-se, no caso, a possibilidade de aplicação de percentual de deságio para o cálculo da pensão mensal deferida em parcela única. A jurisprudência atual desta Corte tem se firmado no sentido de que a aplicação de percentual redutor da condenação indenizatória, na medida em visa a compensar o pagamento de forma antecipada de pensão mensal, não viola o disposto no artigo 950 do Código Civil. Consolida-se, assim, o entendimento de que, quando o pagamento de pensão mensal for convertido em parcela única, haverá a incidência de um percentual de deságio, de forma que compense o pagamento de modo antecipado da indenização por danos materiais, uma vez que o trabalhador somente teria direito ao valor total da indenização ao final do período referente à expectativa de vida. Ademais, entende-se que a aplicação de redutor sobre o valor da indenização por danos materiais, decorrente da conversão da pensão mensal em parcela única, tem por finalidade atender ao princípio da proporcionalidade da condenação, nos exatos termos do artigo 950 do Código Civil. Nesse sentido, o recente precedente da SbDI-1, da lavra do Exmo. Sr. Ministro Aloysio Corrêa da Veiga: E-ED-RR - 2230-18.2011.5.02.0432, Data de Julgamento: 28/04/2016, Data de Publicação: DEJT 06/05/2016. Embargos conhecidos e desprovidos." (E-RR-47300-96.2006.5.10.0016, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, SDI-1, DEJT 17/02/2017)

É certo que, por se tratar de benefício concedido ao trabalhador, a antecipação do pagamento da pensão mensal em cota única, a qual seria paga mensalmente ao longo dos anos, deve importar na adequação do somatório global e aos efeitos inflacionários vindouros, de modo a impedir o enriquecimento sem causa diante da imediata percepção de elevado montante.

Tal deságio não é imune a críticas. Ora, além de não existir na legislação a previsão deste redutor, a jurisprudência não possui critérios precisos e uniformes para a sua correta fixação, o que pode caracterizar desrespeito ao princípio da restituição integral do dano. Nesse sentido é o posicionamento de Neurimar Caus:

“Outras decisões entendem que, havendo antecipação de parcelas, deve ser aplicado um redutor, normalmente em percentual, que gira entre 10% e 30%, mas chegando a até exagerados 50%.
(...)
No entanto há uma enorme discrepância entre os percentuais de redução aplicados e, na maioria das decisões, não há justificativa para adoção de tal critério. Não há como entender-se justificado com o simples fato de que se está recebendo o montante em uma única oportunidade ou porque é um critério razoável.”

Embora não haja um percentual do redutor pré-determinado na jurisprudência, este pode ser fixado de acordo com as circunstâncias apuradas no caso concreto, desde que o montante indenizatório ainda proporcione uma recuperação plena ou amenize o prejuízo causado ao trabalhador. Além disso, os efeitos financeiros incidentes sobre a cota única do pensionamento tendem a compensar a aplicação do redutor.
                              

CAUS, Neurimar. Pensionamento mensal: aplicação de redutor em caso de condenação ao pagamento em parcela única. Revista do tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Porto Alegre, Ano XII, Número 192, Maio de 2016.

MELO, Raimundo Simão de. Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador. 5a edição. São Paulo: LTr, 2010.

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. São Paulo: LTr, 2016.

TST. E-ED-RR-20140-31.2006.5.03.0036, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, SDI-1, DEJT 28/03/2014.

TST. E-RR-47300-96.2006.5.10.0016, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, SDI-1, DEJT 17/02/2017.

TST. E-RR-60200-17.2005.5.20.0001, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, SDI-1, DEJT 03/10/2014.

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