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segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Da constitucionalidade do intervalo especial para a mulher antes do labor extraordinário

Da constitucionalidade do intervalo especial para a mulher antes do labor extraordinário


 A Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, no capítulo intitulado “Da Proteção do Trabalho da Mulher”, prevê intervalo especial para prestação de horas extraordinárias pelas trabalhadoras, nos seguintes termos:
Art. 384 - Em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos no mínimo, antes do início do período extraordinário do trabalho.

 De outro giro, a Constituição Federal de 1988 consagra o princípio da igualdade em seu art. 5º, I, verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;(...)


 Nesse contexto, cumpre indagar: O art. 384 da CLT foi recepcionado pela ordem constitucional em vigor?

 A primeira vista poderia parecer que não, na medida em que a regra parece consagrar uma espécie de privilégio para as mulheres.

 Entrementes, uma análise mais cuidadosa da questão permite inferir que a norma em tela é perfeitamente constitucional. Afinal de contas, a Constituição agasalha o princípio da isonomia que, conforme lição de Aristóteles consiste em tratar de forma igual os que são iguais e os diferentes na medida de sua desigualdade.

 Como é cediço, homens e mulheres, embora tenham em comum a natureza humana, são diferentes do ponto de vista biológico. Muito embora, no mundo moderno, praticamente não exista atividade profissional exclusiva de um gênero, é evidente que a constituição física e orgânica de homens e mulheres repercutem na esfera funcional de cada um.

 Os homens, por natureza, via de regra, possuem maior vigor muscular, o que lhes confere maior resistência e capacidade para certos tipos de trabalho. Por outro lado, apesar do menor tônus muscular, as mulheres tem maior capacidade de realizar várias tarefas ao mesmo tempo.

 Não por outra razão, a Constituição Federal estabelece idades distintas para aposentadoria de homens e mulheres e tempos diferentes para licença maternidade e paternidade. Isso mostra que o Direito está em sintonia com a realidade dos fatos.

 A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho caminha tranquila no sentido da recepção do art. 384 da CLT pela Constituição, conforme revelam os seguintes precedentes:

[...]. PROTEÇÃO DO TRABALHO DA MULHER. INTERVALO ANTES DA SOBREJORNADA. ARTIGO 384 DA CLT. O debate quanto ao intervalo previsto no artigo 384 da CLT não comporta mais discussão nesta Corte, visto que o Pleno, por meio do julgamento do TST-IIN-RR-1.540/2005-046-12-00, o qual ocorreu na sessão do dia 17/11/2008, decidiu que o art. 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição da República. Recurso de revista não conhecido. (RR - 367000-69.2005.5.12.0046 , Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 30/03/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 08/04/2011)
RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE. HORA EXTRA. INTERVALO DO ARTIGO 384 DA CLT. A atual jurisprudência do TST estabelece que o art. 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Não se trata aqui de discutir a igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres, mas sim de resguardar a saúde da trabalhadora, diante das suas condições específicas impostas pela própria natureza. A mulher não é diferente como força de trabalho, pode desenvolver com habilidade e competência as atividades a que se dispuser ou que lhe sejam impostas. No entanto, o legislador procurou ampará-la, concedendo-lhe algumas prerrogativas voltadas para a proteção da sua fisiológica. É o caso do dispositivo em destaque. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. [...]. ( RR - 688500-25.2008.5.09.0652 , Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 23/02/2011, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 11/03/2011)
 Dessa forma, pretensões formuladas por trabalhadores do sexo masculino, de concessão de intervalo de 15 minutos antes do início do labor extraordinário (ou seu pagamento como horas extras em caso de descumprimento) não tem encontrado amparo no Poder Judiciário. A propósito, vejamos o seguinte julgado:

[...]. INTERVALO DO ARTIGO 384 DA CLT. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. O Eg. Tribunal Pleno, por força da Súmula Vinculante 10 do E. STF, na apreciação da inconstitucionalidade do art. 384 da CLT, conforme Incidente de Inconstitucionalidade em Recurso de Revista, acabou por consagrar a tese de que a norma, ao garantir o descanso apenas à mulher, não ofende o princípio da igualdade, face às desigualdades inerentes à jornada da trabalhadora, em relação a do trabalhador. Dessa forma, ao considerar que a referida norma legal se estende ao trabalhador do sexo masculino, o Eg. Tribunal Regional viola o art. 384 da CLT, o qual é direcionado apenas à mulher. Recursos de revista conhecidos e providos. […] ( RR - 849300-84.2006.5.09.0009 , Redator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 01/09/2010, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/11/2010)

 Assim sendo, é forçoso convir que o art. 384 da CLT não consubstancia um privilégio, mas uma norma de proteção que considera a condição biológica da mulher. Trata-se, portanto, de norma perfeitamente constitucional, porque guarda plena conformidade com o princípio da isonomia, conforme inclusive posicionamento corroborado pelo próprio Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 658312.



* Esta postagem é de autoria do colaborador Dr. Rafael Carvalho da Rocha Lima



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