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sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A nova sistemática de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho - Considerações sobre a Lei 13.467/2017

A nova sistemática de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho

Considerações sobre a Lei 13.467/2017

Por Samantha Fonseca Steil Santos e Mello


Resumo: O presente trabalho aborda de forma sucinta o histórico dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho desde o nascimento da Especializada até a edição da novel 13.467/2017, abordando temas como jus postulandi, assistência sindical e revisão da jurisprudência.

Abstract: This paper briefly discusses the history of legal fees in the Labor Court from the birth of the Specialized to the publication of the novel 13.467 / 2017, addressing issues such as jus postulandi, union assistance and review of jurisprudence.

Palavras-chave: honorários de sucumbência; histórico; reforma trabalhista.

Sumário: 1. Histórico dos Honorários na Justiça do Trabalho - jus postulandi e assistência sindical; 2. O advogado como parte essencial da garantia de direitos fundamentais; 3. A reforma trabalhista e o impacto na jurisprudência do TST; 4. Referências bibliográficas.

1. Histórico dos Honorários na Justiça do Trabalho - jus postulandi e assistência sindical

A tormentosa questão dos honorários de sucumbência na Justiça do Trabalho remonta ao ano de 1943, de forma mais específica à redação original do art. 791 da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis: “Art. 791 - Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.”

Veja, o ano era 1943. A sociedade muito menos complexa que nos dias atuais. Simplesmente inexistiam os conceitos atuais de terceirização, responsabilidade do Ente Público, dano moral, existencial, assédio nas suas mais variadas formas, teletrabalho, horas itinerárias. Igualmente, inexistiam ação coletivas, plúrimas, grupo econômico, relações tão liquidas de trabalho. Não menos importante esclarecer que à época da edição da CLT a Justiça do Trabalho nem mesmo era órgão do Poder Judiciário, o que só ocorreu no ano de 1946, com a promulgação da Constituição naquele ano.

Assim, incólume até os dias atuais, o art. 791 da CLT serviu como fundamento para a não concessão de honorários de sucumbência no processo do trabalho, afinal, a contratação de advogado seria mera opção do trabalhador. Não concordamos, contudo, e explicaremos porque mais adiante.

Some-se a isso, a Lei 5.584/70 aduz em seu art. 14 que:

Art 14. Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador. § 1º A assistência é devida a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.”

Tem-se que ao trabalhador, ainda que não sindicalizado, seria prestada a assistência judiciária nos moldes da Lei 1.060/50, ou seja, o fornecimento de profissional habilitado para fins de assistência no litígio.

Pronto, com outra lei não condizente com a realidade social estava fechada a conta: não são cabíveis honorários de sucumbência no processo do trabalho.

E não importa as dificuldades que o trabalhador terá quando buscar auxílio no Sindicato mas não for sindicalizado. Tampouco importa se não houver Sindicato na cidade de residência ou de prestação do serviço.

Como se vê, até a edição da novel 13.467/2017 a jurisprudência aceitou de forma pacífica que legislações que remontam às décadas de 40 e 70 guiassem o destino do processo do trabalho, que nem de longe se assemelha àquela realidade.

2. O advogado como parte essencial da garantia de direitos fundamentais

A Constituição Cidadã, nomenclatura pela qual é conhecida a carta de 1988, é grande marco dos Direitos Humanos e Fundamentais no país. Fosse hoje talvez não seria promulgada em linhas tão progressistas.

A Carta Magna prevê em seu art. 133 que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”, determinando a indispensabilidade do advogado por cumprir função essencial à concretização da Justiça, dentro dos fundamentos constitucionais do direito de defesa, do contraditório e do devido processo legal.

O artigo 133, por evidente, reconhece que o exercício da advocacia é fundamental para a prestação jurisdicional, uma vez que cabe ao advogado postular em favor do cidadão, que desconhece o arcabouço jurídico, mas que busca no advogado o mediador que se manifestará em seu nome e lutará pelo reconhecimento de seus direitos em juízo.

Não é preciso grande esforço argumentativo para que se defenda que um trabalhador estará melhor assistido se litigar em juízo com o auxílio de um profissional com conhecimento técnico, ao invés de fazer uso do jus postulandi, mormente quando leigo, ou seja, sem formação jurídica.

Exemplo prático sepulta a questão.

Em uma ação envolvendo acidente de trabalho típico é possível a cumulação dos seguintes pedidos: indenização por danos morais, materiais, estéticos, inclusão em folha de pagamento (obrigação de fazer), formação de capital, aplicação da teoria objetiva da responsabilidade, com base no comando do art. 927 do CC, dentre outras.

Tem trabalhador condição de formular tais pedidos? Evidentemente não.

A redação do art. 133 da Carta da República não está ali por outro motivo senão pelo óbvio: a integral assistência jurídica da Lei 1060/50 envolve a possibilidade de contratação de um profissional técnico (a exemplo das Defensorias organizadas, na área do Direito de Família), especialmente porque aquele que deu causa à necessidade do provimento jurisdicional deverá suportar seu ônus.

3. A reforma trabalhista e o impacto na jurisprudência do TST

Em 1985 o Colendo Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 219, cuja redação atual é:

Súmula nº 219 do TST HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO (alterada a redação do item I e acrescidos os itens IV a VI em decorrência do CPC de 2015) - Res. 204/2016, DEJT divulgado em 17, 18 e 21.03.2016I - Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitantemente: a) estar assistida por sindicato da categoria profissional; b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. (art.14,§1º, da Lei nº 5.584/1970). (ex-OJ nº 305da SBDI-I).II - É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista.III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego.IV – Na ação rescisória e nas lides que não derivem de relação de emprego, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários advocatícios da sucumbência submete-se à disciplina do Código de Processo Civil (arts. 85, 86, 87 e 90).V - Em caso de assistência judiciária sindical ou de substituição processual sindical, excetuados os processos em que a Fazenda Pública for parte, os honorários advocatícios são devidos entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa (CPC de 2015, art. 85, § 2º).VI - Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, aplicar-se-ão os percentuais específicos de honorários advocatícios contemplados no Código de Processo Civil.” (grifo nosso)

Assim, a jurisprudência consolidada e aplicável em todo país valida os requisitos da Lei 5.584/70 para as relações de emprego, na medida em que dado o alargamento da competência promovido pela EC 45 não é possível exigir que nas demais relações de trabalho esteja a parte assistida pelo Sindicato de sua categoria.

Interessante notar que mesmo após a edição da Constituição no ano de 1988, o C. TST se manteve impassível no entendimento, ao editar em 2003 a Súmula 329:

Súmula nº 329 do TST HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 133 DA CF/1988 (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003Mesmo após a promulgação da CF/1988, permanece válido o entendimento consubstanciado na Súmula nº 219 do Tribunal Superior do Trabalho.”

O panorama segue mantido, ao menos até novembro próximo, com o término da vacatio legis da Reforma Trabalhista.

Prevê o art. 791-A da Lei 13.467/2017, in verbis:

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.§ 1o Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.§ 2o Ao fixar os honorários, o juízo observará:I - o grau de zelo do profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.§ 3o Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.§ 4o Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.§ 5o São devidos honorários de sucumbência na reconvenção.”

Ocorre que o processo do trabalho, originalmente pensado para as relações de emprego, em que se nota traço acentuado de assimetria, precisa lidar com possíveis injustiças que podem advir dessa nossa sistemática.

Se é louvável que o trabalhador faça jus à reparação integral, ou seja, que os honorários de seu patrono sejam suportados pelo réu, que deu causa, em verdade, à demanda, é igualmente certo que há algumas hipóteses não tão cerebrinas que trarão absoluto desconforto aos juristas da área.

Diz o mestre Homero Batista Mateus da Silva que:

Não sei se falo apenas por mim, se não pelos advogados e magistrados militantes ao longo desses anos todos, mas será bem chocante quando chegarem as primeiras notícias de empregados condenados no pagamento de honorários do advogado da empresa. Decisão justa para uns, injusta para outros (...)”(DA SILVA, Homero Batista Mateus, Comentários à Reforma Trabalhista, 2017. Revista dos Tribunais).

Hipótese bastante simples nos permite refletir com alguma profundidade acerca do tema.

Empregado pleiteia horas extras não pagas como único pedido na reclamatória. A empresa não apresenta os controles, alegando cargo de gestão, consoante art. 62 da CLT. Prova aparentemente cindida leva o magistrado, analisando pequenas nuances, a concluir pela improcedência do pleito.

Se o objetivo da Reforma era coibir o abuso, como se bradou aos quatro ventos, nesse caso não havia abuso.

Em suma, os operadores da área jurídica terão que enfrentar ainda outras questões delicadas: i. parâmetro para fixação dos honorários; ii. momento da liquidação dos pedidos; iii. como calcular a sucumbência recíproca, dentre outros.

Para os próximos capítulos a revisão da jurisprudência e os caminhos apresentados pela judicatura de primeiro grau.

4. Referências bibliográficas

Consolidação das Leis do Trabalho.

Constituição Federal.

Lei 1.060 de 05 de fevereiro de 1950.

Lei 5.584 de 26 de junho de 1970.

DA SILVA, Homero Batista Mateus, Comentários à Reforma Trabalhista, 2017. Revista dos Tribunais.

NAHAS, Thereza e outros. CLT COMPARADA URGENTE, 2017. Revista dos Tribunais.

* Esta postagem é de autoria da colaboradora Dra. Samantha Steil, Juíza do Trabalho Substituta do TRT-2

4 comentários:

  1. Não há reparação integral. Nenhum advogado deixa de pactuar e cobrar honorários contratuais em virtude da existência de honorários sucumbenciais, basta verificar o que ocorre em todos os outros ramos do judiciário. O mesmo irá acontecer na justiça do trabalho daqui em diante, ou seja, haverá apenas um plus de honorários ao advogado, chegando na maior parte das vezes a 45% (30% de contratuais e 15% de sucumbência) do valor que fará jus o trabalhador.

    Por outro lado, quando perder a causa o obreiro vai ter uma grande pena advinda a incúria do causídico, mas suportada pelo reclamante.

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    1. É muito fácil agora atribuir toda a "lambança" feita pelo Legislativo aos advogados, como deixa transparecer
      no comentário. Antes de escrever tanta bobagem a pessoa que emitiu o comentário deveria estudar um pouco mais, até mesmo para se orientar sobre o que ocorreu durante tramitação do PL que cumilnou neste "saco de maldades". Por fim, no caso de incúria do advogado, quem se sentir prejudicado pode recorrer ao Judiciário (Teoria da perda de uma chance).





      evia com Para a suposta "incúria do causídico" mencionada, impende ressaltar que a Teoria da Perda de uma Chance

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    2. Não escrevi nenhuma bobagem e sim verdades relevantíssimas para o direito processual braisleiro. Prova disso é que em nenhum momento seus argumentos serviram para desconstruir meu texto, mas somente para confirmá-lo.

      Quanto à possibilidade de contratar um advogado para combater os atos de outro advogado por erro no processo, boa sorte - em especial em uma causa de pouco valor monetário (15% da original). Pode existir na teoria, porém na prática o cliente, como regra, nem fica sabendo que houve o erro, já que não tem nenhuma noção do direito processual (basta ler o item 2 do artigo acima).

      Quanto à "lambança" feita pelo legislativo, certamente não fez sozinho, já que a influência da OAB deve ter sido grande, uma vez que essa questão dos honorários não beneficia em nada os empregadores (nem empregados) que terão um custo a mais quando perderem e nenhum retorno quanto vencerem, já que a reparação integral é meramente teórica e os sucumbenciais vão pro bolso do causídico.

      De todo modo, não sou contra os advogados receberem um plus a mais por seu trabalho, desde que o façam com mais qualidade do que vêm fazendo ultimamente (na média).

      Por fim, não me ofenda. Caso não concorde ataque minhas ideias e não a mim. Chamar o texto de alguém de bobagem e mandar estudar são precisamente o tipo de comportamento e a ideologia que fazem o direito processo nacional ser tão problemático. Obrigado!

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    3. É verdade, só haveria reparação integral se a parte sucumbente, além de pagar os honorários processuais, arcasse também com os honorários contratuais já pagos pelo cliente da parte vencedora. Sem isso, haverá sempre um único vencedor: o advogado, faça ou não um bom trabalho...

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